América: gestão alvirrubra em busca do equilíbrio financeiro |
Por: Felipe Gibson
Três anos depois de estar entre os 20 melhores clubes do país, na Série A do Campeonato Brasileiro, o América vive hoje uma realidade diferente. Na zona de rebaixamento da Série B, o Alvirrubro se mantém como o clube potiguar em melhor posição no âmbito nacional, mas convive com o risco iminente da queda. A mudança é brusca para quem esteve na elite do futebol brasileiro há pouco tempo, no entanto, até antes dos maus resultados a situação já não era das melhores em outro campo, o financeiro.
Mesmo quando esteve no primeiro escalão do futebol nacional, o clube nunca conseguiu patrocínios de peso para montar um time capaz de se manter entre os melhores do país. “Fizemos esforço, mas não conseguimos sensibilizar ninguém. Não se trata de marketing, é mágica para captar patrocínio”, explica o vice-presidente americano, Clóvis Emídio.
E se as dificuldades apareciam mesmo na visibilidade de uma Série A, em divisões em inferiores a situação só piora. As constantes mudanças no elenco e comissão técnica, frutos do mal desempenho da equipe em campo, têm pesado no gastos do Alvirrubro, que independente do que venha a acontecer no resto do ano, com a permanência ou não na Série B, vai fechar o ano literalmente “no vermelho”.
Eleito vice-presidente no ano passado, Clóvis Emídio foi delegado pelo presidente José Maria Figueiredo para assumir a parte financeira e administrativa do clube. Em entrevista ao Portal Mercado Aberto na segunda reportagem da série Negócio da Bola: A Gestão do Futebol no RN, ele fala sobre dificuldades, desafios e metas na gestão do América.
O peso das contas
Desequilíbrio. A palavra se encaixa como poucas quando o assunto é a situação financeira do América. No Alvirrubro, o gasto com futebol gira em torno dos R$ 400 mil, cifra que serve para o pagamento do elenco de jogadores, comissão técnica, funcionários e manutenção do centro de treinamento. O valor até poderia estar dentro da normalidade, mas o jogo vira quando a receita gerada pelo clube não chega perto do que é gasto.
O vice presidente Clóvis Emídio explica que o Alvirrubro conseguiu um dos melhores patrocínios de sua história para 2010, do banco Bonsucesso, investimento que cobre cerca de um quinto do valor gasto pelo clube. O problema é que mesmo assim, as fontes de receita não cobrem o custo do time. Além do banco mineiro, os investidores mais significativos são a FIAT, que paga R$ 10 mil; Facex, que investe outros R$ 10 mil; e a Unimed, que sustenta exclusivamente a estrutura do departamento médico, com R$ 13 mil.
Questionado sobre a falta de investimentos da iniciativa privada, o vice presidente avalia que falta visão aos empresários e políticos do RN. “Eles não têm noção do que representa o futebol para a economia. Em 2007 o clube foi o veículo que mais propagou o nome da cidade e estado no país, porque é América de Natal, do Rio Grande do Norte. Parece aversão às práticas esportivas”.
Fora a iniciativa privada, o Alvirrubro conseguiu uma verba de R$ 130 mil através de uma parceria prefeitura e tem se mobilizado para fechar um novo convênio com o governo. Sobre o valor da bilheteria, Clóvis Emídio é enfático. “Quando empata a despesa com arrecadação já é uma glória, mas em regra a gente tem pago para jogar”. De acordo com o vice presidente a torcida comparece muito em função do resultado. Se o time não vence, o prejuízo é certo.
Quanto ao valor pago pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) pela participação na Série B, Emídio acusa a entidade de ser “madrasta”. “Na Série B em 2010 foram 36 milhões, mas eles só passaram R$ 16 milhões aos times. De maio a dezembro cada um recebeu R$ 100 mil”.
A origem dos problemas
Na avaliação do vice presidente americano a descontinuidade administrativa e a falta de investimentos nas categorias de base são os principais causadores das dificuldades financeiras do clube. Segundo Clóvis Emídio, as dívidas deixadas pelos antecessores dificultam o equilíbrio orçamentário.
“Hoje o cara se candidata, faz casa, batiza, vai embora e entrega na situação que ele pôde entregar. Quem assume já herda um débito que tem de ser quitado”. Emídio relata que a diretoria anterior prometeu entregar o clube com um débito em torno de R$ 200 a R$ 300 mil, no entanto, a cifra ultrapassava R$ 1 milhão.
A outra grande dificuldade são as constantes mudanças no elenco e comissão técnica, segundo o vice presidente, reflexos do esquecimento das categorias de base. “Todo ano é a mesma história. Contratamos um plantel no Estadual, se não deu certo, vem outro para a Série B”, diz Clóvis Emídio, que aponta o gasto com rescisões contratuais como o mais significante para a sobrevivência financeira do clube.
“Alguns jogadores entendem e recebem pelo período trabalhado, mas a maioria quer cumprimento do que está acordado. Pelo menos metade do que falta para cumprir o prazo contratual”. O vice presidente avalia que a revelação de atletas no América é a chave para abater os gastos em questão e ao mesmo tempo montar um time competitivo.
“Se tem hoje como máxima no futebol de que se um clube não conseguir vender um jogador por ano, ele tende a desaparecer. Nos últimos anos estamos na contra mão dessa história. De 30 atletas do elenco, apenas o zagueiro Adalberto é da base, o resto é jogador de aluguel”, finaliza.
Planejamento e pés no chão

Assim como em anos anteriores, a tendência de o América fechar 2010 em débito deve se confirmar, entretanto 2011 promete mudanças quanto aos gastos do clube. Na tentativa de alcançar a autosuficiência que permita investimentos na estrutura e na base do clube, o vice presidente planeja trabalhar com os “pés no chão”.
“Não vamos mais fazer a loucura que vem se repetindo nos últimos 10 anos. A partir do ano que vem o América vai viver a realidade financeira que lhe cabe”, conta Clóvis Emídio. De acordo com ele a situação de bancar um elenco de R$ 300 ou R$ 350 mil, enquanto o clube não arrecada nem metade disso, não se repetirá. O vice presidente explica que o planejamento será fechado na última quinzena de 2011, e independente da permanência na Série B, o objetivo é ter um time com capacidade de liquidez.
“O América vai ter equilíbrio independente de pressão de torcida ou conselho, é preciso viver a realidade. Isso não quer dizer que não vamos lutar para ser campeão estadual e fazer um bom papel nas competições nacionais. Só posso ter uma equipe de R$ 100 mil? Vou ter. Mas vou estar ao mesmo tempo investindo na categoria de base” avalia Clóvis Emídio.
A meta do vice presidente é chegar a um estágio próximo do Vitória/BA, conhecido nacionalmente por seu investimento na base, que revela e vende jogadores para clubes brasileiros e estrangeiros. Para tanto, além do dinheiro do próprio clube, Emídio aposta na Fábrica de Craques, projeto aprovado integralmente no Ministério dos Esportes e que prevê orçamento do Governo Federal para a revelação de talentos no Alvirrubro. “A ideia é instalar cinco núcleos de treinamento para jovens no interior”, revela.
No campo do marketing o objetivo é fortalecer a marca América. O sócio torcedor, por exemplo, não gera receita atualmente. “Captamos a quantidade compatível com o investido”, esclarece o vice presidente, que enaltece a necessidade de massificação dos sócios para tornar o projeto lucrativo. Além disso, Emídio conta que o setor de marketing deve ser terceirizado. De acordo com ele o clube já fechou um contrato de licenciamento da marca para iniciar o ano com a comercialização de 2 mil produtos do Alvirrubro.
Alienação da sede
Sobr
e a possibilidade que vem sendo discutida de alienar a sede do clube, na avenida Rodrigues Alves, o vice presidente reforça que nada foi definido em termos valor. Segundo Emídio inicialmente o pensamento é facultar as empresas para apresentação de uma proposta. “É preciso entender que a única forma de sobrevivência do América é utilizar esse quarteirão, mais caro de Natal, porque não tem espaço na área nobre desse tamanho”, explica.
A expectativa do dirigente é que o investimento gere uma renda fixa de no mínimo R$ 200 mil mensais ao Alvirrubro. O projeto prevê uma parceira com a preservação da maioria da sede social e fachada. A empresa fará uso próprio de parte da área e em outra ela deve construir um empreendimento que gere renda.
“Trabalhamos a possibilidade de um edifício de negócios, para escritório, salas, cinema e banco, ou quem sabe um espaço de estacionamento, algo difícil na cidade hoje. O que há de verdade é que será formalizada uma proposta arquitetônica, será aberta uma espécie de licitação e a melhor proposta será aprovada pelo conselho”, finalizou.












